Em Ouro Preto, a fama da república era a pior possível: velhacouto de canalhas, antro de perdição, portão do mundo das drogas, etc. Nem mais nem menos que as demais, o merchandising era que era melhor: quando um professor perguntou porque a república não tinha bicho (calouro, novato que fica meio "escravinho" nos primeiros tempos, vira um faz-tudo, tem que obedecer aos veteranos), a resposta veio pronta: "Como? Só se alguém morrer de overdose pra vagar lugar, aqui ninguém forma!".
Tatá era um dos moradores - tinha sido rebatizado como era de praxe, o apelido era Tavares - um personagem do Chico Anysio. Por mérito próprio, logo virou "Travares", por motivos óbvios. A voz rouca, comportamento errático (lia Spix e Martius tomando cachaça), mantinha em seu quarto uma plantinha de estimação, de certa espécie proibida por constituir ameaça à segurança pública (adoro esses eufemismos: esses dias li num livro antigo, ao invés de "sexo"," atividade em que se engajam dois adultos de gêneros opostos para fins reprodutivos, mas não só". Adorei o "mas não só". Aliás, adoro o "mas não só", tanto figurativa quanto literalmente...).
Vai daí que a fama da república se espalha e a polícia resolve fazer uma batida preventiva. Com cachorro, escopeta e úscambau. E pegam Tatá dormindo num canto após uma noitada daquelas, "a baba elástica e bovina" pendente na boca, um caco. Levantam o sujeito com aquela delicadeza toda própria, Tatá entreabre um olho, vê aquele povaréu uniformizado, e grita, reclamando em voz alta com os demais, a voz engrolada e rouca: "Quem foi o cretino que mandou convite pro exército?!" Pláft!, coronhada na cabeça. Caiu só o pacote pro lado.
Logo depois, a república revistada de alto a baixo, a plantinha foi desentocada do quarto e estava sendo recolhida. Tatá junta forças, se levanta num salto e com o dedo em riste ameaça o herege: "Se você TOCAR nesse plantinha, eu ligo pro IBAMA agoooora!". Pláft!, outra coronhada.
Entrelinhas, entremontes
Há um ano
Um comentário:
Imagino toda a cena e morro de rir! Nada como as boas histórias das Repúblicas de Ouro Preto!
Como ex-aluna posso dizer: que bom que temos histórias para contar!
Abraco, Anna Christina.
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