“Te faço, me deixe, espie - a ama negra fez muitas vezes com as palavras o mesmo que com a comida: machucou-as, tirou-lhes as espinhas, os ossos, as durezas, só deixando para a boca do menino branco as sílabas moles”. Esse trecho (bonito!) do Gilberto Freyre mostra a fusão cultural na linguagem, entre negros e portugueses – o mesmo ocorreu com os índios. Me fez pensar: dos três povos principais, apenas os portugueses tinham uma sociedade hierarquizada, estratificada; negros e índios viviam de forma comunal, mesmo quando, no caso africano, já tinham dominado o ferro e a moeda. A alma individualista, personalista, que tanto mal fez e faz ao Brasil, é ibérica. O torpor social, a aceitação passiva, a cordialidade, a conciliação: também. A essa tendência juntou-se a comunal aceitação tribalista, a acostumada obediência ao senhor. Tudo o que se fez de grande, no Brasil, dependeu da vontade férrea de indivíduos: raríssimos os movimentos coletivos criadores de algo que não fossem fazendas no ar. E não venham me dizer que a Coluna Prestes ou Canudos foram exemplos de movimentos coletivos: desaguaram nessa forma pela vontade demiúrgica de seus chefes ou fanáticos religiosos. Vargas, Juscelino, Chatô, Mauá e tantos outros: fizeram sua versão de Brasil, para melhor ou para pior. A outra imensa maioria só se aproveitou dessa que está aí e vai há séculos empurrando o povo para a miséria e para o aprendizado da sobrevivência apesar do governo.
Entrelinhas, entremontes
Há um ano
Um comentário:
Não tem jeito: quando saio da linguagem mais coloquial acabo descambando pra um quase-formalismo meio pedante...
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