Se houvesse um prêmio de cultura inútil, acho que eu estaria disparado entre os finalistas... estava hoje lendo sobre uma confusão em relação ao sapato da Cinderela. Sério! A polêmica inicial era sobre a conotação sexual da história - e acaba numa divergência sobre o sapatinho ser de cristal ou não, já que Charles Perrault, quando adaptou a história oral, teria confundido "vair", pele, com "verre", vidro, por conta dos sons parecidos. Mas o interessante é a sanguinolência dos contos originais: no final da Cinderela tradicional, a madrasta e as irmãs são obrigadas a calçar botas de ferro em brasa e dançarem até morrer... antes, as irmãs já tinham cortado os dedos dos pés para conseguirem calçar o tal sapato. No conto da Bela Adormecida, a princesa que dorme como se estivesse morta é estuprada pelo príncipe - e fica grávida! Em alguns, morrem todos, em outros, os personagens se vingam de maneira terrível, como essas botas de ferro, ou matam com requintes de crueldade. Temos que lembrar que quando tomaram forma, a Europa estava dividida em centenas de pequenos feudos, a justiça, quando havia, só servia aos poderosos, e o mundo era em geral bastante cruel. Aliás, algumas leis, reais, pareciam com os contos de terror mesmo - como a que dava o "direito de pernada", o direito do Senhor de desvirginar qualquer serva nos limites de suas propriedades - antes do casamento, elas obrigatoriamente tinham que passar uma noite com o senhor das terras... durante o período em que esses contos nasceram houve também a Peste Negra, que dizimou metade da população européia. Realmente, os finais felizes não eram coisa rotineira - deviam ser uma espécie de ficção científica da época.
Entrelinhas, entremontes
Há um ano
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