18 de nov. de 2009

Heróis

"Para Homero e para o mundo da nobreza desse tempo, a negação da honra era, em contrapartida, a maior das tragédias humanas. Assentava nisso toda a sua ordem social: a ânsia de honra neles era simplesmente insaciável, sem que isso seja característica moral peculiar aos indivíduos como tais. Era natural e indiscutível que os heróis maiores e os príncipes mais poderosos exigissem uma honra cada vez mais alta. Ninguém receia, na Antigüidade, reclamar a honra devida a um serviço prestado; a exigência de pagamento é para eles aspecto secundário e de modo nenhum decisivo. O elegio e a reprovação são a fonte de honra e desonra. É difícil para o homem moderno imaginar a absoluta exposição da consciência, entre os Gregos. Para eles não existe, efetivamente, nenhum conceito como a nossa consciência pessoal. A ânsia de se distinguir e a aspiração à honra e à aprovação (...) aparecem aos Gregos como  a aspiração da pessoa ao ideal e suprapessoal, onde começa o valor." in Paideia, de Werner Jaeger.


......O herói se torna herói pela sua ânsia de reconhecimento e de honra, pois só assim ocupa posição destacada dentre os homens... é interessante o paralelo deste conceito de herói com o conceito grego de nomos. As coisas podem ser contextualizadas de três formas: as que brotam da natureza (phuó, de onde se origina a palavra física, physis); as coisas que se transformam ou são criadas pelas artes e habilidades da intervenção humana (techné, de onde vem técnica, tecnologia); e as coisas que adquirem seu sentido por convenção ou atribuição do grupo ou sociedade, o nomos. Acho que não é sem razão que a reputação seja construída assim, e a parte de "ilustrar o nome", tornar-se ilustre e conhecido, relacione-se com nomos, com coisa que existe por significação e atribuição coletiva.

......Mas o conceito evolui para a aquisição de consciência pessoal, e o existencialismo propugna a existência completa em si mesmo - o viver completamente, o além do homem, a superação em si e para si. Isso envolve, claro, contrariar e contradizer todos à sua volta por uma crença absolutamente pessoal - e aqui vou ceder ao apelo sentimental de meus marcos miliários: estava no meio desses pensamentos quando veio à cabeça o exemplo paradigmático de tal "herói para si" - o Dom, Nosso Senhor Quixote. Legendei o trecho com a música onde ele expressa o significado de sua "missão", que coloco abaixo.



PS: Um exemplo muito didático da divisão de classificação pré-socrática de "coisas", dada pelo prof. Robert C. Bartlett, é o de uma árvore (cresce - phuó - por si só, sem intervenção humana ), que pela ação humana se transforma em papel (techné), e que pela convenção adquire valor quando se torna uma nota de um real, por exemplo (nomos).

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